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STJ relativiza regra que impossibilita a penhora de salário

Em abril de 2023, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ganhou notoriedade por tratar de um tema de interesse geral: dívidas. O tribunal tratou sobre a possibilidade de penhora do salário do devedor para pagamento de dívida não alimentar. A lei determina que valores de natureza salarial não podem ser utilizados para o cumprimento de obrigações, salvo nos casos específicos determinados pela Lei e julgados do STJ.

Entretanto, a Corte Especial estabeleceu, em julgamento do recurso interposto de embargos de divergência, que a regra da impenhorabilidade dos valores provenientes de salários pode ser relativizada, porém em caráter excepcional. O estabelecido recai para o pagamento de dívida não alimentar, independentemente do salário recebido pelo devedor. Contudo, o valor a ser pago pelo devedor deve ser definido considerando sua própria subsistência, que não pode ser prejudicada pela ação judicial.

O relator, ministro João Otávio de Noronha, foi acompanhado dos demais ministros ao explicar que a relativização somente deve ser aplicada “quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução” e, ainda asseverou: desde que “avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado”.

Impenhorabilidade dos salários

O caso em apreço versou sobre o objeto da execução de uma dívida resultante de cheques no valor aproximado de R$ 110 mil. O credor interpôs os embargos de divergência sobre o acórdão da Quarta Turma do STJ, que rejeitou o pedido de penhora de 30% do salário do devedor – em torno de R$ 8.500,00.

Para a Quarta Turma, a jurisprudência do STJ trata da exceção da regra geral da impenhorabilidade dos salários para as seguintes situações:

  1. no caso do pagamento de verba alimentar de qualquer origem, independentemente da remuneração recebida;
  2. no caso do devedor (executado) possuir remuneração superior a 50 salários-mínimos mensais, fica liberado o pagamento de qualquer outra dívida não alimentar, salvo eventuais particularidades do caso concreto.

Em ambos os casos, a decisão deve preservar a capacidade de subsistência do devedor e de sua família.

Contudo, o credor apresentou precedentes do Tribunal (Corte Especial e Terceira Turma) em que o afastamento da impenhorabilidade dos salários deu-se somente pelo fato da medida não comprometer a subsistência do devedor, seja qual for a natureza da dívida ou a remuneração do executado.

Para o relator, a divergência residia na condição, a ser definida, da impenhorabilidade dos salários na hipótese de dívida não alimentar – se o afastamento da penhora estaria vinculado somente à garantia do mínimo necessário para a subsistência do devedor ou se, além disso, deveria ser considerado o limite mínimo de 50 salários mínimos recebidos pelo devedor.

Relativização da regra da impenhorabilidade
A jurisprudência do STJ orientou a decisão do tribunal sobre a possibilidade de relativização da regra da impenhorabilidade do artigo 833 do CPC. Segundo Noronha, a supressão da palavra “absolutamente” no caput do referido artigo trata a impenhorabilidade como relativa, “permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade”.

Como orientação, o ministro ressaltou que a ponderação sobre a aplicação da regra deve ser feita tendo em vista a dignidade da pessoa humana, de forma a resguardar as partes, o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade previstos em nosso ordenamento jurídico.

Nesse sentido, relator destacou que “a fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família”.

Por fim, restou entendido que o parágrafo 2º do artigo 833 do CPC pode ser reconsiderado para autorizar a penhora de salários inferiores a 50 salários-mínimos, desde que seja condizente com o caso concreto e se mantenha preservada a capacidade de subsistência digna do devedor e sua família.

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